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Justiça anula decreto de Leitinho que aprovou loteamento Jd. das Videiras

Juíza de Nova Odessa apontou haver ‘insuficiência’ em estudos técnicos relacionados aos impactos do empreendimento e questionou densidade territorial, drenagem, rede de coleta de esgoto, trânsito e demanda por transporte público ao entorno

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Paulo Medina
redacao@jno.com.br

A juíza Michelli Vieira do Lago Ruesta Changman, da 2ª Vara Judicial de Nova Odessa, declarou nulo o decreto municipal que aprovou o loteamento Jardim das Videiras. O decreto havia sido sancionado pelo prefeito Cláudio Schooder, o Leitinho (PSD), e foi alvo de uma ação popular movida pelo vereador Silvio Natal, que questionou a legalidade do decreto.
A sentença teve como fundamento principal a ausência de base legal no momento em que o decreto foi emitido, em 14 de junho de 2022. À época, a legislação local não previa a existência de ZEIS (Zona Especial de Interesse Social), figura jurídica utilizada pelo decreto para justificar o loteamento. “O poder público municipal buscou regularizar a questão legal referente à autorização do empreendimento, no entanto, não havia legislação que amparasse a ocupação da área como sendo de interesse social”, destacou a magistrada.
A juíza mencionou que a Lei Complementar nº 70, criada especificamente para viabilizar o loteamento, foi promulgada apenas em abril de 2022, posteriormente ao início da tramitação do projeto. “A Lei Complementar nº 70/2022 foi criada exclusivamente para alterar a destinação de áreas objeto das matrículas 12.721 e 21.121 para ZEIS”, destacou a sentença. No entanto, essa alteração foi questionada devido à falta de estudos técnicos que justificassem a mudança no zoneamento urbano e à ausência de audiências públicas adequadas.
A decisão judicial também abordou o processo legislativo que aprovou a Lei Complementar nº 70. Segundo a juíza, houve “convocação do Conselho Municipal de Desenvolvimento com menos de 72 horas de antecedência”, e a participação popular foi prejudicada, caracterizando violação ao princípio da “impessoalidade” na administração pública.
Outro ponto de contestação foi a metragem dos lotes prevista pelo loteamento. O projeto aprovado permitia lotes de 183 metros quadrados, em contrariedade ao Plano Diretor de Nova Odessa, que estipula 300 metros quadrados como metragem mínima para lotes residenciais. “O decreto aprovado viola o Plano Diretor Municipal, que não prevê a hipótese de fracionamento na forma aprovada, e muito menos, na dimensão aprovada”, afirmou a magistrada.
Em resposta à ação, a construtora Água Branca negou a venda de unidades do empreendimento e defendeu a legalidade do decreto, afirmando que ele estava em consonância com a nova legislação urbana de Nova Odessa. Contudo, o Ministério Público opinou pela nulidade do decreto, argumentando que a aprovação do loteamento ocorreu em desacordo com as normas urbanísticas vigentes na época. O prefeito apresentou defesa dizendo que a criação da Lei Complementar 70/2022 e do decreto tiveram por objetivo “atender à demanda habitacional do município, promovendo a inclusão social, pois era necessário atender as demandas das famílias de baixa renda”.

ESTUDOS TÉCNICOS
A magistrada, porém, apontou haver “insuficiência” nos estudos técnicos envolvendo os impactos do empreendimento. “Mas o que mais chama a atenção, no entanto e a bem da verdade, e que considero o mais importante fundamento da procedência da presente ação, é o fato de que os estudos técnicos necessários para a apuração dos impactos do empreendimento revelam-se insuficientes para garantir o cumprimento rigoroso do que prevê a legislação de regência. Nesse sentido, em que pese a juntada aos autos do EIV – Estudo de Impacto de Vizinhança – há considerações relevantes a fazer sobre os estudos apresentados. A primeira diz respeito ao parecer técnico da Secretaria de Obras do Município, que focou seu parecer mais na alegada demanda social por habitação, represada devido à dificuldade de aprovação anterior de outros projetos) do que nos aspectos técnicos de engenharia, infraestrutura urbana e de uso e ocupação de solo que o empreendimento poderia oferecer, ou deixar de oferecer. A segunda diz respeito à superficialidade do estudo apresentado, em áreas extremamente sensíveis à população, limitando-se a afirmar, sem qualquer empenho numérico e técnico, que não haveria, a título de exemplo, qualquer impacto para a população ligado à oferta de ensino, lazer, cultura, saúde, consumo de energia elétrica, segurança, ventilação e iluminação, paisagem urbana, patrimônio natural e cultural da vizinhança, poluição visual e ocupação do solo”, afirmou.
A juíza considerou ainda que não foram abordadas questões como densidade territorial, resolução de problema de drenagem e da rede de coleta de esgoto, trânsito de veículos e demanda por transporte público.
“O terceiro questionamento diz respeito à ausência de juntada de estudo de impacto ambiental, valendo lembrar que a elaboração do EIV não substitui a elaboração e a aprovação de estudo prévio de impacto ambiental (EIA), requeridas nos termos da legislação ambiental. O quarto diz respeito à falta de prova quanto à assunção de contrapartida pela empresa requerida quanto a toda infraestrutura necessária ao bem estar populacional. Feitas essas considerações, entendo que as questões materiais, relativas à segurança do empreendimento para a população e à contrapartida contratual pesam mais ou tanto quanto as questões legais levantadas, muito embora estas tenham sido alvo de diversas tentativas de superá-las. Desta forma, é de rigor a procedência da demanda para que seja declarado nulo o Decreto nº 4577 de 14 de junho de 2022”, conclui a magistrada.
A Prefeitura de Nova Odessa não comentou a decisão judicial.

Ministério Público Estadual emitiu parecer favorável à ação popular

Em junho, o JNO mostrou que o Ministério Público emitiu parecer favorável à procedência da ação popular questionando a aprovação do loteamento Jardim das Videiras.
As ZEIS foram inicialmente introduzidas no ordenamento urbanístico de Nova Odessa pela lei complementar 36/2014. No entanto, essa lei foi declarada inconstitucional em 12 de março de 2021, um dia antes da aprovação final do loteamento, tornando ilegal qualquer aprovação de empreendimento em áreas de ZEIS a partir de 13 de março de 2021.
O parecer do Ministério Público, assinado pelo promotor Carlos Alberto Ruiz Nardy, destaca que, apesar da anulação da lei 36/2014, o município aprovou o loteamento em 22 de julho de 2021, com a publicação do decreto 4.450/2021 cinco dias depois. “Desta forma, tal aprovação foi ilegal, eis que não havia mais na legislação municipal a zona urbanística em questão”, afirma o promotor em seu parecer.
Em 2022, Leitinho aprovou a implantação do loteamento Jardim das Videiras, com 315 lotes, numa área total de 120 mil metros quadrados ao lado do Jardim Campo Belo e próximo à Comunidade Geriátrica. O decreto assinado pelo chefe do Poder Executivo foi publicado no Diário Oficial do Município, véspera de feriado prolongado.
Na época, a juíza Eliane Cássia da Cruz, da 1ª Vara Judicial, já havia indeferido o registro do loteamento, seguindo parecer do Ministério Público.

Prefeito aprovou loteamento com mais de 1,1 mil terrenos na escassez hídrica

O prefeito Cláudio Schooder, o Leitinho (PSD), aprovou recentemente o 18º empreendimento em três anos e meio de governo. Trata-se do “Parque Jardim Atlântica”. O empreendimento conta com 1.128 lotes e será implantado em uma área de 581.238 m², ao entorno da Represa do Laurindo, que registra baixo volume de água em meio à escassez hídrica que afeta a cidade e toda região.
O “Parque Jardim Atlântica” destina 44,24% de sua área total para lotes residenciais e comerciais, enquanto 55,76% será utilizado para áreas públicas, incluindo sistema viário, áreas institucionais e espaços livres de uso público. Um total de 24,90% da área do empreendimento será destinado a áreas verdes. A decisão de aprovar o loteamento em meio à escassez hídrica levanta preocupações sobre a sustentabilidade hídrica da cidade, que enfrenta seca severa e o volume das represas só diminui.
Paralelamente, o governo Leitinho sinalizou a liberação de mais oito novos empreendimentos imobiliários. A iniciativa é vista pelo vereador Elvis Pelé (PL) como um risco para o planejamento urbano da cidade, com possibilidade de falta d’água e de vagas em escolas e prejuízos ao atendimento médico na cidade.
Entre 2022 e 2023, foram aprovadas 1.955 unidades de apartamentos, 1.126 unidades de lotes e 695 unidades de casas.