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Bate-Rebate: Crescimento vendido em lotes

Por trás dos outdoors vistosos, dos slogans otimistas e dos panfletos coloridos que prometem “qualidade de vida” em novos empreendimentos imobiliários, Nova Odessa esconde uma realidade bem menos charmosa.

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Crescimento vendido em lotes
Por trás dos outdoors vistosos, dos slogans otimistas e dos panfletos coloridos que prometem “qualidade de vida” em novos empreendimentos imobiliários, Nova Odessa esconde uma realidade bem menos charmosa — e perigosamente próxima do colapso urbano. Em um roteiro que lembra novela ruim (com enredo batido e vilões previsíveis), a cidade parece ter trocado planejamento por especulação, infraestrutura por improviso e bem-estar coletivo por lucro imediato.

Básico esquecido
Em poucos anos, nada menos que 28 empreendimentos foram aprovados sob a batuta do governo Leitinho, que ao que tudo indica, se esqueceu do básico: água, escola, saúde e transporte. Moradores, que em 2010 somavam pouco mais de 51 mil, agora são mais de 62 mil e, em breve, podem ultrapassar os 80 mil. E para onde vão todos esses novos cidadãos? Vão beber água de onde, estudar onde, adoecer para serem atendidos por quem? Mistério. Nem a prefeitura, nem o Ministério Público parecem ter a resposta.

Papel na praça
“Estão vendendo lote como se estivessem distribuindo papel na praça”, resume Ana Paula, moradora do Jardim Santa Rosa. A frase diz tudo: Nova Odessa virou um grande feirão de terrenos. Paga-se por um CEP, mas entrega-se um campo minado de incertezas urbanísticas.

Ironia
A ironia do crescimento “planejado” é que ele ignora completamente o planejamento. Nenhuma nova represa para garantir abastecimento, nenhuma escola nova para absorver a demanda crescente, nenhum novo posto de saúde. Em vez disso, temos bairros brotando como cogumelos, espalhados em todas as direções da cidade, muitos distantes do Centro, dos serviços, do mínimo. São os chamados bolsões habitacionais: aglomerados humanos jogados em periferias urbanas sem conexão, sem estrutura e, em breve, sem paciência.

Bandeira vermelha
Já há quem levante a bandeira vermelha: a cidade correrá risco real de apagões no abastecimento em alguns anos, superlotação escolar e colapso nos serviços de saúde. A cada lote vendido, cresce a preocupação de quem já mora aqui e a revolta, que não cabe mais nas ruas (e muito menos nos antigos bairros que agora dividem espaço com obras e promessas).

Preocupação ensaiada
O Ministério Público, que em outros tempos ensaiou preocupação com o avanço desordenado dos loteamentos, agora parece atuar como espectador VIP no camarote do caos. “Se o MP sabe, acho que deveria agir. Agora é a população que vai fiscalizar o fiscal”, alfineta morador do Jardim São Manoel. Já tem gente que afirma que pedirá que a Corregedoria acompanhe o próprio Ministério Público. Afinal, quando o fiscal precisa ser fiscalizado, o sistema está gritando por socorro.

Grito
E por falar em grito, o que se ouve nos bairros é um clamor por decência administrativa. Nova Odessa, segundo relatos, virou um negócio. Um grande lote com cara de cidade, só que sem alma, sem estrutura e sem rumo. Uma espécie de condomínio gigante sem síndico, onde o lucro dita as regras e o futuro de quem mora aqui é mera nota de rodapé.

A serviço de quem?
Porque, no final, não se trata apenas de crescimento. Trata-se de para quem esse crescimento serve. E, por enquanto, a resposta parece clara: serve muito bem aos incorporadores. Já aos cidadãos… resta a esperança e alguns litros d’água, enquanto ainda há.